sábado, 20 de abril de 2013

À milanesa [parte 1]: No meio do caminho havia uma cidade, havia uma cidade no meio do caminho.

Sabe aquela pessoa que nunca encheu seus olhos, mas sempre cruzou o seu caminho, e pouco a pouco foi te cativando, ao passo que demonstrava sua beleza interna, a externa foi melhorando, até que finalmente você dá uma chance a ela e então vocês estabelecem um "lance" e aí ela nunca mais sai da sua vida? Pois então, das cidades do mundo, a cidade de Milão é essa pessoa pra mim.
Nunca tinha pensado nem em passar por perto dela, simplesmente não me apetecia visitá-la, até que em 2010 havia uma Milão no meio do caminho, no meio do caminho havia uma Milão...
Estava no sul da frança, prestes a terminar minhas aulas de francês e precisava decidir por onde começaria meu "grand euro tour". Meu irmão acabara de chegar a Nice para passar uns dias mais tranquilos depois de uma temporada ibizenca, e por alguns dias também viajaria comigo, logo teria voz na decisão do destino. Além dele, quem estava programando passar o final de semana conosco era a Taty (grande amiga feita no curso, hoje também blogueira reconhecidíssima no cenário da moda de Campinas e SP), e foi então que ela veio com a proposta: "pooo meu, por que a gente não vai pra Milano? Lá é a meca da moda!!" ... Eu levei a proposta para o meu irmão que contrapropôs irmos para a Croácia, considerada a Ibiza dos Balcãs (parece que ele já estava com saudade da vida agitada da ilha espanhola). Eu aceitei as duas propostas e tratei de uni-las: havia um trem que fazia Veneza - Zagreb (com algumas poucas paradas, porém muitas horas de viagem), e no meio do caminho Nice - Veneza, estava justamente Milão... Era o destino e não tinha como fugir dele.
Eu e meu irmão chegamos na cidade numa noite de sexta-feira chuvosa, depois de um desencontro dramaturgo na estação nice-ville e um reencontro cinematográfico na estação de ventimiglia (um post futuro contará com detalhes este que foi um dos episódios mais inacreditáveis e emocionantes da história da nossa irmandade). Parecia que a cidade não estava nos recebendo da melhor maneira possível. Taty chegou na manhã seguinte para darmos início ao nosso final de semana turístico. Tudo ocorria dentro dos conformes até que avistamos um outdoor anunciando um show do Mark Knopfler (consagrado guitarrista do Dire Straits) e nos animamos para ir. A questão é que não estava claro se seria mesmo naquela noite, de todo modo achamos que seria válido a tentativa. E foi aí que mais uma vez ficou provado que quem ousa vence, de uma maneira ou de outra. Aquela noite prometia ser de temporal, mas ainda assim resolvemos sair, sem guarda-chuva, sem lenço, mas com documento, para achar o bendito show. Seria em algum lugar nos arredores do Castelo de Sforzesco, e quando adentramos os portões do próprio avistamos um tenda lá no final e subitamente um pé d'água desabou na nossa cabeça. Corremos, corremos muito, não sei se foi na emoção de ter encontrado o local do show ou fugindo da chuva. O importante é que quando chegamos perto da tenda, percebemos não ser um show de rock, mas continuamos por conta do nosso segundo grande motivo. Quando a adentramos, desabamos em risos e gargalhadas: se tratava de um baile da terceira (talvez quarta) idade, de dimensões colossais. Acho que toda a população idosa de Milão estava debaixo daquela mesma lona com os mesmos propósitos de dançar, se divertir, e ser feliz, e quando os propósitos são esses a idade pouco importa, assim sendo, nem pensamos na hipótese de sair de lá. Afinal, se ali estávamos rindo e gargalhando, por que haveríamos de lá sair?! Em minutos, os três já estavam devidamente acompanhados, dançando, bebendo, tirando fotos e filmando aquele momento singular e inédito. O ponto alto foi a banda tocar ao vivo "Panamericano" (we speak no americano), maior sucesso do ano de 2010, e que, pra quem não sabe, é inspirada numa canção italiana consagrada por Renato Carosone na década de 50, chamada "tu vuò fa l'americano".
Naquele mesmo ano de 2010, semanas depois, eu retornaria a Milão, após ter visitado Croácia e Grécia, quando já estava de volta pro continente (geografica e propriamente dizendo) e rumava pro centro-norte europeu, lá estava aquela cidade manhosa no meu caminho. Dessa vez fiquei hospedado na casa de Alice, namorada italiana de um grande amigo brasileiro, que mora nas cercanias de Monza, famosa pelo seu GP de F1. Inclusive foi lá que ao chegar numa padaria típica, um senhorzinho, ao perceber que eu era brasileiro, fechou uma porta para me mostrar, pendurado atrás dela, um pôster do Ayrton Senna do Brasil! Ele ainda me disse com a voz embargada: "depois que este aqui morreu, a F1 acabou... Ele foi o maior de todos", foi então que uma lágrima minha escorreu de tanto orgulho por ser brasileiro e também por lembrar do choro copioso da minha mãe naquela triste manhã de maio de 1994. O importante foi que passar aqueles dois dias com a Alice e suas amigas, me deu uma perspectiva mais local e real da vida milanesa (o que me agradou bem mais)
Em setembro de 2011, eu fui para Florença estudar italiano, e nos finais de semana eu viajava para algum local com voo low-cost. Pois bem, estava em Bordeaux resolvendo umas pendências com uma francesa iniciadas na ilha de Ios (Grécia) no ano anterior, quando meu skype tocou: era minha prima dizendo que meu tio estava em Milão para visitar uma feira de máquinas e queria que eu fosse pra lá encontrá-lo. Em se tratando desse meu tio, missão dada é missão cumprida, e na hora eu tratei de organizar a logística para lá chegar, e ela foi muito simples (para não disser odisséia): saí de Bordeaux um pouco depois das 11 e só cheguei ao encontro do meu tio às 22... Andei na chuva, peguei ônibus em pé, voei para Bologna, peguei outro ônibus, para depois pegar um trem, para só então pegar o metrô e finalmente caminhar um pouco mais, debaixo de chuva, até o hotel. Quando atravessei o lobby do hotel e ele me avistou do restaurante, sorriu um sorriso tão sincero, que no curto espaço do instante de 1 segundo ele fez valer todo meu esforço daquela eternidade de 11 horas de baldeação. Ele estava praticamente sozinho, não tinha experiência com viagens internacionais e não falava outra língua senão o português. Fui até ele para garantir que sua viagem não fosse somente de negócios, fosse também de lazer, pois ele muito merece se divertir vide o tanto que trabalha. Por mais que tenha sido por menos de 48h, o tempo que ficamos juntos foi de muita alegria e gargalhada, e sei que a minha presença proporcionou a ele momentos que sem mim ele jamais sonharia em fazer... Uma justa retribuição por tudo que ele já fez por mim na vida.
Já era hora de seguir meu destino até Florença onde deveria voltar a estudar, afinal de contas, Milão era só uma cidade no meio do caminho, o caminho que no seu meio tinha uma cidade.

[CONTINUA...]











Um comentário:

  1. Viagem histórica essa, assim como o baile! Nunca se viu na cidade de Milano geração da melhor idade mais feliz com exímios dançarinos brasileiros! Faltou o vídeo que comprova isso. Parabéns por traduzir tão bem em palavras aventuras e emoções mundo afora. Sucesso no blog! Bjs, Taty

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